Blindar-se contra o golpismo: não pode?
Segundo a mídia corporativa, não pode. O que pode é o fascismo tomar o Senado da República via emendas Pix, deep fakes de IA, via chacinas, nas eleições de 2026, para depois pôr o Supremo de joelhos.
Em 2016, quando o Supremo Tribunal Federal admitiu prisão após condenação em segunda instância — com alvo certo, voto de Gilmar Mendes e ao arrepio da Constituição de 1988 —, explodiram em palmas o Jardim Botânico, o solar dos Civita e a alameda Barão de Limeira, e deu para ouvir também o jornaleiro Bernard Gregoire soprando sua corneta, montado em seu cavalo, anunciando a boa-nova na capa do Estadão.
O Brasil vivia, na época, a farra das “medidas excepcionais” fabricadas na 13ª de Curitiba e nos gabinetes da task force mancomunada com o DoJ; “medidas excepcionais” para “tempos excepcionais” engendrados nos jardins, solares e alamedas da mídia corporativa.
Agora, quando Gilmar Mendes despacha para proteger o STF da tentativa do produto daquela época, o fascismo à brasileira, de repetir no Brasil o que a internacional fascista já fez na Hungria e na Polônia, ou seja, pôr a Justiça prostrada no âmbito do mais excepcional dos tempos desde a Segunda Guerra; agora, dizíamos, as redações explodem, muito republicanas, em fúria jurisprudencial.
O Estadão corneta: “decisão teratológica”. Na Folha: “Gilmar Mendes põe ministros entre autoridades acima da lei”. No jornal O Globo, jornalista e notório professor isentão da USP cravam, respectivamente, que “blindagem por canetada de Gilmar é golpe na democracia” e “Gilmar Mendes implode sistema de freios e contrapesos”, como se na Hungria e na Polônia restasse breque ou contramedida a quem tem como projeto reduzir a democracia a pó.
Na Globo News, comentarista de política reconhece que o Brasil vive um golpe continuado, que isto não é de hoje e que o próximo golpe dentro do golpe já está anunciado, é este e pode ser o de misericórdia: um strike em ministros do STF não sancionados por Trump, começando por Alexandre de Moraes, derrubando Flavio Dino, quem sabe Edson Fachin e por que não um último pino, o próprio Gilmar Mendes.
Mesmo assim, o comentarista comenta que, se criticou a PEC da Blindagem do Legislativo, agora tem de criticar também o que chama de “PEC da Blindagem do Judiciário”.
Que apenas uma das duas seja coisa de bandidagem, quem se importa? Que diferença faz que o que revelou nesta sexta-feira, 5, no Uol, o repórter Fábio Serapião? Isto: o homem que tem a caneta para fazer andar impeachments de ministros do STF recebeu canetas emagrecedoras não liberadas pela Anvisa das mãos de “Beto Louco”, empresário acusado pela Polícia Federal de ligação com o PCC e hoje foragido da Justiça. Quem se arrisca, quem bota a cara para esclarecer que uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa, se a bacia do isentismo, do doisladismo, do encimadomurismo está sempre ali, à mão, para lavar as mãos?
Blindar-se contra o golpismo: não pode? Segundo a mídia corporativa, não. O que pode é o fascismo tomar o Senado da República via emendas Pix, deep fakes de IA, via chacinas, nas eleições de 2026, para depois pôr o Supremo de joelhos.
“O problema do Brasil”, como se sabe, é legião, mas um dos demônios que andam por aqui em grupos do quinto dos infernos é a pusilanimidade que grassa na mídia corporativa, em regra. Ou, como disse Luis Nassif no GGN a respeito da “interminável discussão sobre a decisão do ministro Gilmar Mendes”, uma “multidão de semi-juristas espalhados pela mídia” que têm dificuldades com o “mundo real”.
Quando Gilmar Mendes despacha contra os direitos dos povos indígenas, por exemplo, nenhum jornal sai gritando “implosão por canetada da democracia!”. Quando Gilmar opera como promoter de surubadas juscorporativas no exterior, orgias de conflitos de interesses entre o Judiciário, o capital e o Centrão, nenhuma emissora dá à coisa o nome que ela merece, e sim “Gilmarpalooza”.
Mas quando o decano do Supremo atua, como disse Moisés Mendes no Brasil 247, em “legítima defesa de um patrimônio institucional ameaçado”, ameaçado por golpistas, aí, senhoras, senhores, não pode, não. Aí é “golpe”…



