Comissão de Mortos e Desaparecidos: concluída a barganha com os ocultadores de cadáveres
Após um ano e meio de injustificável procrastinação, o presidente Lula resolveu enfim reinstalar a Comissão Especial Sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, extinta no final do governo Bolsonaro. A comissão foi criada no governo FHC para localizar corpos de vítimas da ditadura e para indenizar suas famílias.
A volta da comissão foi uma promessa de campanha de Lula, mas não uma dessas que podem ser cumpridas até o meio do mandato, por um motivo tão simples quanto duro: a cada dia que passa, mais difícil fica o trabalho de encontrar restos mortais, ainda mais aqueles malocados com expertise, esmero e brio militares.
De modo que para alguns dos familiares de desaparecidos pela ditadura, familiares que neste ano e meio vinham implorando pela volta da Comissão Especial Sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, não é certo se caberá a expressão “antes tarde do que nunca” quando virem o decreto de reinstalação do colegiado finalmente publicado no Diário Oficial da União.
A ver se haverá cerimônia de reinstalação da comissão e se algum representante dos ocultadores de cadáveres, quem sabe o comandante do Exército, general Tomás Paiva, irá comparecer para balbuciar algo diferente de “quem procura osso é cachorro”.
A informação sobre a volta da comissão foi adiantada na noite desta quarta-feira, 3, pela Folha de São Paulo. A Folha diz que “o próprio presidente Lula decidiu pelo momento da recriação da comissão”. No mesmo dia, mais cedo, o jornal O Globo mostrou que os gastos públicos com inativos e pensionistas das Forças Armadas dispararam 85% nos últimos 10 anos e chegarão a R$ 856 bilhões nas próximas décadas.
O ritmo é quase o dobro do aumento de gastos com aposentadorias do funcionalismo federal nos últimos 10 anos, que foi de 46%, e o valor previsto do que será pago a militares inativos e viúvas e filhas de militares nas próximas décadas representa 60% do valor estimado para servidores civis aposentados, com a diferença de que milicos não contribuem para arcar com as despesas de quando passarão para a reserva, apenas para financiar seus pensionistas.
Lula, no entanto, vem sinalizando que não pretende mexer na previdência dos militares. Não no curto prazo. Quid pro quo. Por via das dúvidas, o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, e o general Tomás Paiva estão ativando a sua comissão também, esta “informal” e “para se antecipar e tentar conter eventuais reduções nas aposentadorias” castrenses.
Agora, espera-se que a Comissão Especial Sobre Mortos e Desaparecidos Políticos não sofra uma nova procrastinação, “informal” também; espera-se que o funcionamento do comissão não seja prejudicado pelo arrocho de R$ 25,9 bilhões no Orçamento de 2025 anunciado também nesta quarta por Fernando Haddad, em outro quid pro quo, este com os especuladores que ora atacam o real.
Os detalhes do arrocho virão no próximo 22 de julho. Por enquanto, Haddad adiantou apenas a cifra e que a orientação de Lula “é que o arcabouço seja preservado a todo custo”. O arcabouço fiscal, rebranding do teto de gastos, é inegociável. A busca e identificação de brasileiros trucidados e desaparecidos pela ditadura, nem tanto.
Enquanto isso, o general golpista de agora Paulo Sergio Nogueira de Oliveira e o almirante idem Almir Garnier dos Santos, por exemplo, recebem todo mês, cada um, R$ 35 mil em remuneração militar bruta de inativo; e as duas filhas do carniceiro de outrora Carlos Alberto Brilhante Ustra recebem, todo mês, cada uma, R$ 17 mil em remuneração militar bruta de pensionista.