'Deixem o homem conspirar'
“É tudo que Eduardo Bolsonaro queria”, dizem os Mervais, Guedes e Sadis, com pusilanimidade liberalóide, sobre a ação na verdade tardia da PGR contra o complô estrangeiro do 03.

Parece que a mídia brasileira já “formou maioria” para reclamar que o procurador-geral da República, Paulo Gonet, tenha resolvido agir contra a conspiração em praça pública de um deputado federal com agentes estrangeiros contra os poderes constituídos do Brasil.
Nesta segunda-feira, 26, Gonet pediu ao STF abertura de investigação contra Eduardo Bolsonaro pelo que Eduardo vem fazendo em seu autoexílio nos EUA; pelos crimes de obstrução contra investigações, coação no curso do processo e atentado à soberania do Brasil.
“É tudo que Eduardo Bolsonaro queria”, dizem os Mervais, Guedes e Sadis, sempre prontos a desfilarem nos programas de comentários sobre tudo toda a sua pusilanimidade liberalóide, segundo a qual o melhor remédio contra os Bolsonaros da vida, para que eles deem com os burros n’água e quem sabe desapareçam, é todo mundo, inclusive a Justiça, fechar os olhos, fingir que não os vê.
“É tudo que Eduardo Bolsonaro queria”, dizem, como quem diz: “deixem o homem conspirar”.
Mesmo depois de tudo o que o Brasil passou por ignorar, minimizar, menosprezar, e finalmente naturalizar como “parte do jogo” a ascensão de Bolsonaro pai.
Incrível.
Vamos, então, lembrar o que foi que aconteceu na outra vez em que Eduardo Bolsonaro resolveu conspirar em praça pública com agentes estrangeiros contra os poderes constituídos do Brasil, sob os olhos bem fechados da mídia e da Justiça?
Já contamos a história várias neste Come Ananás. Lá vamos nós mais uma vez.
Em outubro de 2022, entre o primeiro e o segundo turnos das eleições daquele ano, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) embarcou para a Argentina supostamente para “mostrar a dura realidade” do país vizinho, então governado pela esquerda, a fim de “alertar os brasileiros sobre as consequências de votar no socialismo”.
Na época, enquanto pegava fogo a campanha do segundo turno da eleição para presidente no Brasil, Eduardo Bolsonaro passou quatro dias em Buenos Aires na companhia de três cidadãos argentinos; para cima e para baixo com o “consultor político digital” Fernando Cerimedo, dono do site extremista La Derecha Diario, e dois jovens ligados a Cerimedo, Ezequiel Acuña e Giovanni Larosa.


Apenas duas semanas após aquela viagem de Eduardo Bolsonaro, e quatro dias após o pai de Eduardo ser derrotado por Lula no segundo turno, o principal anfitrião do 03 na Argentina, Fernando Cerimedo, “quebrou a internet” no Brasil transmitindo de Buenos Aires, via La Derecha Diario, uma live intitulada “Brazil Was Stolen” (“O Brasil Foi Roubado”).
Na live, Cerimedo afirmou que tinha recebido um relatório do Brasil apontando que determinados modelos de urnas eletrônicas haviam registrado fraudulentamente mais votos para Lula do que para Jair Bolsonaro.
Antes de ser derrubado no Brasil por determinação do TSE, o vídeo de Cerimedo viralizou como um rastilho de pólvora entre os grupos bolsonaristas na internet e ajudou a impulsionar os acampamentos golpistas que começavam pulular na frente dos quartéis, alimentando-os com o slogan "Brazil Was Stolen" ao longo de novembro, dezembro e até o 8 de janeiro de 2023.
No dia da live “Brazil Was Stolen”, 4 de novembro de 2022, o segundo anfitrião de Eduardo Bolsonaro na Argentina, Ezequiel Acuña, postou no então Twitter uma foto dos bastidores da live, num indicativo de que Acuña estava presente no local e na hora da transmissão.
O terceiro cicerone de Eduardo Bolsonaro na Argentina, Giovanni Larosa, era referido na época tanto como “correspondente do La Derecha Diario no Brasil” quanto como “assessor de Eduardo Bolsonaro para assuntos internacionais”. Na prestação de contas das despesas de campanha do deputado em 2022, consta um pagamento para Larosa no valor de R$ 3,9 mil, conforme revelou a agência Pública em julho de 2023.
Na campanha eleitoral de 2022, Giovanni Larosa chegou a viajar no avião presidencial com Jair Bolsonaro, a quem chamava de “el chefón”. O jovem acompanhou a apuração do primeiro turno com “el chefón” e “Bolso Jr.” em Brasília.




No inquérito do golpe, a Polícia Federal mostrou que Fernando Cerimedo foi municiado com dados para a live “Brazil Was Stolen” por um major da reserva do Exército Brasileiro e pelo “gênio de Uberlândia” contratado pelo PL de Valdemar Costa Neto - e de Jair e Eduardo Bolsonaro - para envenenar as hordas bolsonaristas contra as urnas eletrônicas.
A PF mostrou também que, após a live, militares da ativa usaram sites do exterior para repercutir o “VT” entre os bolsonaristas acampados na frente dos quartéis, a fim de driblar o controle de fake news eleitorais pelo TSE.
A PF indiciou Fernando Cerimedo e Valdemar Costa Neto no inquérito do golpe, mas o procurador-geral da República, Paulo Gonet, preferiu não denunciar ao STF nem o argentino, nem Valdemar, cortando, no processo, o fio das relações exteriores da tentativa de golpe de Estado - um fio que parece levar a pelo menos um deputado federal, à direção do maior partido do Congresso Nacional e a militares da ativa do Exército Brasileiro conspirando com cidadãos estrangeiros para dar um golpe de Estado no Brasil.
Todos eles a serviço de “el chefón”.
Eduardo Bolsonaro sequer foi indiciado pela PF, muito menos denunciado pela PGR por tentativa de golpe de Estado. Leve e solto, “Bolso Jr.” está hoje no exterior, nos EUA, levando a “oto patamá” sua tendência, digamos, congênita para urdir com forças estrangeiras sabotagens contra o Brasil, agora com cúmplices mais poderosos, bem mais poderosos.
Quem poderia imaginar?