Deputado que pode ser punido por motim na Câmara quer 'cair atirando' em povos indígenas
Horas após o motim, Marcos Pollon apresentou projetos de lei para armar "cidadãos de bem" e propostas para anular a homologação ou declaração de posse permanente de 21 Terras Indígenas em todo o país.
Um dos deputados que participaram do sequestro do plenário da Câmara na semana passada, Marcos Pollon (PL-MS), apresentou na última quinta-feira, 7, dia seguinte ao fim do motim parlamentar, nada menos que 37 propostas legislativas de uma tacada só. Sob risco de suspensão do mandato, Pollon protocolou na Mesa da Câmara, por exemplo, cinco projetos de lei para incentivar “cidadãos de bem” a comprar armas de fogo e 21 projetos de decreto legislativo para sustar a homologação, declaração de posse permanente ou processo de delimitação de Terras Indígenas em nove estados de todas as regiões do Brasil.
Sobre armas, Pollon propôs: criar o “Selo Empresa Parceira da Liberdade” para empresas que incentivem o armamento da população; instituir o “Selo Cidade Segura” para “municípios que apresentarem altos índices de regularização de posse e porte de armas de fogo por cidadãos de bem”; autorizar “a construção de estandes de tiros particulares vinculados à pessoa física”; reconhecer “a prática da tiroterapia como atividade lúdica de lazer” a ser exercida por maiores de 18 anos ou maiores de 14 anos acompanhados pelos pais; autorizar saque do FGTS “para a aquisição de arma de fogo por trabalhador”.
O deputado apresentou ainda, na mesma leva, um projeto de lei para reconhecer “a prática da caça como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil”.
Fundador do Movimento Pró-Armas, Marcos Pollon já tinha apresentado recentemente, antes do FGTS Pró-Armas, o “Minha Primeira Arma”, um projeto de lei de incentivo à compra do primeiro revólver, pistola ou carabina “inspirado no modelo do Minha Casa, Minha Vida”.
Em 2021, quando ainda não tinha mandato, Pollon defendeu em um evento “conservador” que brasileiros comprassem armas para reagir ao “luladrão” e ao STF: “quando você toma a decisão de comprar uma arma, antes mesmo de tocar nela, você tomou um decisão irrevogável: você não vai ser mais vítima, e a partir daquele momento, qualquer injustiça vai calar fundo no seu peito, e você reage. Você reage ao 'luladrão', você reage à corte que está querendo destruir o país”.
Agora mesmo, em junho, o deputado foi o principal nome do I Fórum Nacional do Movimento Invasão Zero, onde latifundiários receberam aulas de táticas de violência contra sem-terra e indígenas num hotel à beira-mar em Ilhéus, no sul da Bahia. Uma Terra Indígena do sul da Bahia, a TI Aldeia Velha, em Porto Seguro, está entre as mais de 20 em todo o país contra as quais Pollon quer “cair atirando” agora que seu mandato subiu no telhado por impedir o funcionamento do Poder Legislativo. Veja a lista completa das TIs nas mira do paladino da “tiroterapia”:
Terra Indígena Pindoty/Araçá-Mirim (SP)
Terra Indígena Cacique Fontoura (MT)
Terra Indígena Rio Gregório (AC)
Terra Indígena Kariri-Xocó (AL)
Terra Indígena Avá-Canoeiro (GO)
Terra Indígena Tremembé da Barra do Mundaú (CE)
Terra Indígena Arara do Rio Amônia (AC)
Terra Indígena Uneiuxi (AM)
Terra Indígena Amba Porã (SP)
Terra Indígena Djaiko-aty (SP)
Terra Indígena Guaviraty (SP)
Terra Indígena Peguaoty (SP)
Terra Indígena Apiaká do Pontal e Isolados (MT)
Terra Indígena Maró (PA)
Terra Indígena Cobra Grande (PA)
Terra Indígena Rio dos Índios (RS)
Terra Indígena Tapy’i (SP)
Terra Indígena Aldeia Velha (BA)
Terra Indígena Acapuri de Cima (AM)
Terra Indígena Sawré Muybu (PA)
Terra Indígena Apyka’i (MS)
Marcos Pollon foi o deputado federal mais votado no Mato Grosso do Sul nas eleições de 2022. Ele é considerado a principal liderança armamentista do país e é muito próximo a Eduardo Bolsonaro. Dias atrás, dos EUA, onde conspira contra o Brasil, Eduardo postou assim no Twitter/X: “Como o deputado Pollon diz: MINHA MÃE PARIU UM HOMEM”. Junto, Eduardo repostou o tuíte de uma “influencer” que dizia: “existem os homens, existem os machos e existe o Pollon”.
Agora, denunciado à Corregedoria da Câmara por participação no Putsch da Chapelaria, o maior macho da face da Terra não fala mais tão alto e belicoso. Agora, Marcos Pollon guincha baixinho que “sou autista e não entendi o que estava acontecendo”. Diz isso e se esgueira numa campanha de vitimização e “ressignificação” do preconceito, na esteira da falsificação pela extrema-direita da bandeira da liberdade e ao mesmo tempo em que o bolsogolpismo tenta dar um abraço de tamanduá nos Direitos Humanos, contra Alexandre de Moraes.
No último sábado, 9, por exemplo, Marcos Pollon tomou café da manhã com membros da Associação de Mães e Amigos de Autistas de Caarapó (AMAAC), cidade do sul do Mato Grosso do Sul vizinha a Dourados, terra natal de Pollon, e onde em 2016 fazendeiros precursores do Movimento Invasão Zero e dezenas de jagunços atacaram violentamente o acampamento de uma retomada Guarani Kaiowá. O acampamento foi destruído com fogo e retroescavadeiras e o indígena Clodiodi Aquileu Rodrigues de Souza foi morto a tiros. Outros seis indígenas, inclusive uma criança de 12 anos, foram baleados naquele dia, no episódio que ficou conhecido como Massacre de Caarapó.
A AMAAC publicou fotos do encontro com Marcos Pollon em suas redes sociais. Em uma delas, crianças posam com Pollon usando bonés estampados com o quebra-cabeça colorido, símbolo do Transtorno do Espectro Autista, e o nome do deputado, tendo ao fundo um painel do Movimento Pró-Armas. Em outra, Pollon conversa com senhoras da associação tendo ao fundo uma foto de um Jair Bolsonaro sorridente e usando chapéu de boiadeiro. A presidente da AMAAC, a senhora Thaila Luzia Farias, é também presidente do diretório do União Brasil em Caarapó, “terra da erva-mate”.