Dez anos sem Leandro Konder, e os tempos mudaram
Konder alertou que os fascistas seguiam trabalhando infatigavelmente. Mais prudentes, mais discretos, mas "preparando-se para tempos melhores", que lhes permitissem "maior desenvoltura".
Nesta terça-feira, 12, completam-se 10 anos da morte do filósofo marxista Leandro Konder, um dos mais brilhantes intelectuais que este país já produziu. Guardo não como troféu, mas amuleto, um exemplar de “A questão da ideologia” no qual o Konder deixou, com caneta azul e letra miudinha, de menino, “meu abraço de companheiro pra você” - pra mim!
Mas é de outro livro de Leandro Konder que quero falar nestes 10 anos de sua morte: “Introdução ao fascismo”, escrito em 1977.
Não vamos aqui cometer o clichê do “mais atual do que nunca”, mas vamos reproduzir um trecho do último capítulo do livro, no qual Konder alertava, na época, que o capital monopolista se recusava a deixar o fascismo morrer, porque precisava dele: “dá-lhe injeções, reanima-o, sugere-lhe sucedâneos para os alimentos que lhe faltam, guerras ‘localizadas’, guerras ‘intestinas’, ‘agressões internas’, etc. Se não é possível vendê-lo por atacado, tenta-se vendê-lo no varejo, a prestações”.
Diz Leandro Konder, nos parágrafos derradeiros do seu “Introdução ao fascismo”:
As circunstâncias exigem dos fascistas que eles sejam mais prudentes e mais discretos do que desejariam. Pragmaticamente, adaptam-se às exigências dos novos tempos. Mas continuam a trabalhar, infatigavelmente, preparando-se para tempos “melhores”, que lhes permitam maior desenvoltura.
Tal como no conto A colônia penal, de Franz Kafka. O comandante da colônia, que tinha instalado nela um regime de tipo fascista, morrera e fora enterrado nos fundos de uma taverna, embaixo de uma mesa. Com sua morte, o fascismo tinha sofrido uma grave derrota, na penitenciária. Mas sobre o seu túmulo foi colocada uma lápide com a seguinte inscrição:
Aqui jaz o antigo comandante. Seus adeptos, cujos nomes por ora devem permanecer secretos, dedicaram-lhe esta pedra tumular. Dentro de alguns anos, quando seus adeptos forem mais numerosos, ele voltará a se erguer e reconquistará a colônia. Tende fé e esperai.
Exatos 17 dias após a morte Leandro Konder, no dia 29 de novembro de 2014, Jair Bolsonaro lançou-se candidato a presidente da República em plena Academia Militar das Agulhas Negras. Dirigindo-se a centenas de cadetes, no dia da formatura do aspirantado, Bolsonaro prometeu assim:
“Alguns vão morrer pelo caminho, mas eu estou disposto, em 2018, seja o que Deus quiser, a tentar jogar para a direita este país”.
“Líder! Líder! Mito! Mito!”, foi a resposta dos formandos, em coro, aclamando Bolsonaro.
Dez anos depois, onde estão hoje, em que postos, com que ideias sob o quepe, aqueles 427 aspirantes a oficiais que receberam o espadim de Caxias na turma de 2014 da Aman? Hoje, estão dispostos a aderir a quê, aqueles jovens que naquele dia, após anos e anos de lapidação do “caráter militar”, foram ao delírio com um aviso de muitas mortes de brasileiros e a promessa de “jogar para direita este país”?
“Tende fé e esperai”.
Já o destino do então comandante da Aman, isto é bem conhecido. O comandante da Aman na época, aquele que permitiu o ato político ilegal dentro de Organização Militar do Exército Brasileiro, virou comandante do Exército Brasileiro - o comandante atual. Trata-se do general Tomás Miguel Miné Ribeiro Paiva, o general “legalista”.