Não acaba nunca?
As “Forças Desarmadas” bem que podiam cumprir suas nobres missões e responder na mesma moeda de quem só faz golpeá-las reiteradamente, pondo o pau na mesa, mas junto com a lei: "acabou, porra!".
Jurista predileto do Partido Militar, parecerista da ideia milico-degenerada de que a Constituição de 1988 dá às Forças Armadas um "poder moderador", difundidor do veneno de que o TSE interferiu a favor de Lula nas eleições de 2022, Ives Gandra Martins apareceu na Escola Superior de Guerra (ESG) em junho do ano passado, aos seis meses do governo Lula, para dar uma palestra sobre “O Estado Democrático de Direito e o Protagonismo do Judiciário".
A palestra de Ives Gandra na ESG aconteceu poucos dias após a Polícia Federal enviar ao STF um relatório no qual o palestrante aparecia como um tipo de guru jurídico de uma minuta de decreto golpista encontrada no celular do tenente-coronel Mauro Cid.
A palestra foi para os alunos da turma de 2023 do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia (CAEPE). Como integrante da turma anterior do CAEPE, a de 2022, o coronel do Exército Anderson Freire Barboza não teve o privilégio de assistir ao “jurista da quartelada” pontificar sobre Estado Democrático de Direito após o 8/1, na vigência do governo Lula III, em plena Escola Superior de Guerra, que é vinculada diretamente ao Ministério da Defesa. Mas não faz mal. O coronel Barboza, como o tenente-coronel Cid, é prodígio do sistema de ensino das Forças Armadas.
Neste sábado, 23, a Folha de S.Paulo revelou que Anderson Barboza, hoje reformado e ele próprio diretor de um curso da ESG - o Curso de Gestão de Recursos de Defesa -, reagiu desse modo ao indiciamento de uma penca de oficiais do Exército no inquérito da Polícia Federal sobre a trama golpista, dizendo assim em um grupo de WhatsApp: “as pessoas estão esquecendo que as eleições foram roubadas sob o comando de Alexandre de Moraes”.
“Desde a soltura do ladrão até TODOS os atos perpetrados em favor de LULA na corrida eleitoral”, completou o coronel.
Ouvido pela Folha, Anderson Barboza confirmou - sem constrangimento, sem problema nenhum -, ser o autor da mensagem, dizendo que decidiu “responder na mesma moeda” o que chamou de “ilações”. O coronel disse ainda que suas mensagens foram “um desabafo, pois os militares que conheço entre os 37 citados são profissionais extremamente competentes, o que naturalmente gera um sentimento de tristeza".
Foi também com sentimento de “tristeza”, segundo Bela Megale, que a cúpula das Forças Armadas recebeu a operação da Polícia Federal que na semana passada prendeu quatro militares que tramaram para assassinar Lula, Geraldo Alckmin e Alexandre de Moraes em 2022. Além disso, consta que um detalhe sobre a operação Contragolpe “irritou” integrantes de altas patentes das Forças Armadas: o fato de a PF desencadear a operação no Dia da Bandeira…
Pretendem “responder na mesma moeda” também, os altos círculos militares? Parece que sim: o coronel Anderson Barboza não foi imediatamente afastado das suas funções na Escola Superior de Guerra e o Ministério da Defesa, transformado por Múcio Monteiro em Relações Públicas da caserna, não se pronunciou até agora sobre o flagrante do apoio do coronel Barboza à trama golpista-assassina de 2022 - apoio flagrado pela Folha e reiterado pelo coronel à reportagem.
A ESG é diretamente vinculada à Chefia de Educação e Cultura do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas (EMCFA), no âmbito do Ministério da Defesa. O atual chefe de Educação e Cultura do EMCFA é o general quatro estrelas Francisco Humberto Montenegro Junior. O general Montenegro era chefe de gabinete do comandante do Exército, general Tomás Paiva, quando o coronel Anderson Barboza foi nomeado para a ESG, em setembro do ano passado. Foi ele, Montenegro, quem assinou a nomeação.
O atual chefe de Educação e Cultura do Ministério da Defesa assinou também, em 2019, também como chefe de gabinete do comandante do Exército, um ofício a todos os quartéis do Brasil dizendo que estavam mantidas as celebrações do golpe de 64 determinadas pelo então presidente da República, Jair Bolsonaro. A determinação de Bolsonaro tinha sido alvo de representação do Ministério Público. Na época, o comandante do Exército era o general Edson Pujol.
O general Montenegro foi chefe de gabinete dos comandantes do Exército: Pujol, Paulo Sérgio Nogueira, Marco Antônio Freire Gomes (todos no governo Bolsonaro), Júlio Cesar Arruda e, até pouco tempo atrás, de Tomás Paiva (os dois últimos no governo Lula).
Indefectível, Montenegro não chegou a assinar, mas, segundo a grande imprensa, teve influência na nota “Às Instituições e ao Povo Brasileiro”, com a qual os então comandantes do Exército, Marinha e Aeronáutica declararam apoio ao “povo brasileiro” acampado na frente dos quartéis, em novembro de 2022, e ameaçaram com o “cumprimento das nobres missões de Soldados Brasileiros” as instituições que tentassem mandar os acampados para casa.
Assim como o general Paiva teve influência no tuíte com o qual o Exército ameaçou o STF na véspera do julgamento do Habeas Corpus de Lula, em 2018.
O general Paiva também não falha: na época, era ele o chefe de gabinete do comandante do Exército - no caso, o general Eduardo Villas Bôas - e foi ele quem sugeriu o termo-chave da ameaça: “repúdio à impunidade”. Foi ele também, o atual comandante do Exército Brasileiro, que disse assim ao repórter Fábio Victor, também em 2018, no gabinete de Villas Bôas no Forte Apache, sobre uma resolução de 2016 do PT que mencionou necessidade de reforma no sistema de promoção e nas escolas das Forças Armadas:
“Foi uma coisa burra”.
Estava implícita na declaração política do general Paiva uma das “justificativas” para o apoio do Exército ao golpe de 2016 contra Dilma Rousseff, além dos trabalhos da Comissão Nacional da Verdade.
As “Forças Desarmadas” da República, como diria Edson Fachin, deveriam ficar muito tristes e irritadas com tudo isso e bem que podiam, pra variar um pouco, cumprir suas nobres missões e responder na mesma moeda de quem só faz golpeá-las reiteradamente, pondo o pau na mesa, mas junto com a lei: “acabou, porra!”.
Bom dia
Devem começar a futucar lá trás no
"tenentismo" ...