Notas sobre moda e mesa, por Roberto Campos Neto
Numa entrevista a Miriam Leitão, o presidente minguante do Banco Central, Roberto Campos Neto, afirmou que espera que seu sucessor não seja julgado pela cor da camisa que usar para votar, nem pelos jantares aos quais comparecer.
Primeiro, sobre moda:
Às vésperas da eleição de 2022, uma das inúmeras mentiras disseminadas por Jair Bolsonaro foi que o TSE proibiria o uso de camisas da seleção da CBF, uniforme do bolsonarismo, e demais figurinos verde-amarelos nas seções eleitorais.
“Tem interferência demais. Ele [Alexandre de Moraes] tá com medo de quê? Um mar de verde e amarelo? Vocês estão preocupados com um mar de verde e amarelo votando? Aparecer o nome do Lula ganhando, é isso TSE? É isso TSE? Essas medidas é para proibir isso aí? Eu tô convidando a todos voluntariamente votar com a camisa verde e amarelo”, disse Bolsonaro numa live no dia 28 de setembro de 2022.
Bolsonaro chegou a anunciar a mobilização das Forças Armadas contra uma proibição que não existia:
“O que as Forças Armadas puderem garantir para vocês votarem de verde e amarelo, vai ser garantido. Eu determino, vou determinar às Forças Armadas, que vão participar das seguranças, qualquer seção eleitoral em que for proibido entrar com a camisa verde e amarelo, não vai ter eleição naquela seção”.
Logo após a live, o TSE soltou uma nota reafirmando que “eleitores são livres para manifestar individual e silenciosamente a sua opção política, podendo usar camisetas, bottons, dísticos e adesivos ao ir votar”.
De modo que todo o contingente populacional popularmente conhecido como “gado” vestiu-se de Neymar Jr., poucos dias depois, para anunciar nas seções eleitorais seu voto orgulhoso em Jair Bolsonaro, tal e qual vestiram-se de verde-amarelo, para votar, de Tarcísio de Freitas a Braga Netto, passando por Nikolas Ferreira e Roberto Campos Neto.
Usando a camisa da seleção da CBF para votar, Roberto Campos Neto, além de “apenas” manifestar voto em Bolsonaro, atendeu à convocatória de Bolsonaro para “todos voluntariamente votar com a camisa verde e amarelo” como remédio para o caso de “aparecer o nome do Lula ganhando”.
Para registro do tal “julgamento da História”: nas eleições de 2022, o Presidente do Banco Central do Brasil agiu como a Equipe das Forças Armadas de Fiscalização do Sistema de Votação Eletrônica, conjurando, todos “técnicos” e dentro das suas possibilidades, o fantasma da fraude eleitoral.
A Miriam Leitão, porém, Campos Neto tentou fazer sua manifestação “individual e silenciosa”, mas ostensiva, de opção política por Jair Bolsonaro – e de adesão ao “mar verde e amarelo” que iria expor fraude a favor de Lula -, Campos Neto, dizíamos, tentou fazer tudo isso parecer mera opção de moda na hora em que abriu o armário e escolheu a camisa da CBF, em vez de alguma polo cáqui da Lacoste, para combinar com seu título de eleitor.
Agora, rapidamente, sobre mesa:
Em junho, Roberto Campos Neto foi o convidado de honra de um jantar dado por Tarcísio no Palácio Bandeirantes justamente no momento em que Lula começava a subir o tom contra a sabotagem do presidente bolsonarista do Banco Central à atividade econômica. Foi, portanto, um jantar de desagravo político no qual a sobremesa, segundo a Folha de S.Paulo, foi uma conversa entre o convidado e o anfitrião sobre a hipótese de o primeiro assumir o Ministério da Fazenda em caso de vitória do segundo na eleição presidencial de 2026.
A Miriam Leitão, no entanto, Campos Neto tentou fazer parecer que apenas saiu para comer risoto de cogumelos com ancho n’algum encontro de netos ricos de antigos serviçais da ditadura.
Campos Neto pede, afinal, que seja lembrado pelas “decisões técnicas” que tomou.
Sobre a “decisão técnica” de manter os juros nas alturas, até ela, Miriam Leitão – a senhora “decisões técnicas” – entende que “os juros estão muito altos”, mesmo que o cenário seja de inflação baixa e dentro do intervalo de flutuação da meta. Sobre a “decisão técnica” de se recusar a intervir no mercado de câmbio, com leilões de dólares, diante de ataques especulativos ao Real, bem, até os calouros de Economia da Universidade da Califórnia, onde Fields Grandson graduou-se, há um tempão, até eles sabem que os manuais mandam o contrário.
Faz um tempão maior ainda que Honoré de Balzac escolheu a seguinte epígrafe para seus “ensaios sobre a moda e a mesa”:
“Adivinha-se o espírito de um homem pela maneira como ele porta sua bengala”.