O gabinete de curiosidades do general Tomás Paiva
O atual comandante do Exército, general Tomás Paiva, já teve dois chefes de gabinete no Forte Apache, os dois reaproveitados dos mais altos gabinetes da trama golpista de 2022.

Nem parece, mas chefe de gabinete do comandante do Exército é cargo importante. Sim, senhora. Sim, senhor. Na história recente do país, pelo menos um ocupante do cargo chegou a influir na… história recente do país. Foi em 2018, quando o chefe de gabinete do general Villas Bôas, então comandante da Força, foi quem sugeriu o termo-chave da ameaça feita pelo Exército ao STF na véspera do julgamento do habeas corpus de Lula contra a prisão em segunda instância.
“Repúdio à impunidade”. Foi este o termo-chave sugerido pelo general Tomás Miguel Miné Ribeiro Paiva para turbinar a ameaça de Villas Bôas. Foi esta a contribuição do general Tomás Paiva para tirar Lula da eleição de 2018. Cinco anos depois, finalmente de volta ao Palácio do Planalto, Lula nomeou o antigo chefe de gabinete de Villas Bôas para o comando da Força Terrestre, onde Tomás Paiva, que está de férias, encontra-se até hoje.
Até hoje, enquanto comandante do Exército, o general Tomás Paiva já teve dois chefes de gabinete, os dois reciclados, reaproveitados, recuperados dos mais altos gabinetes da trama golpista de 2022.
O primeiro foi o general Francisco Humberto Montenegro Junior, que foi chefe de gabinete de todos os últimos comandantes do Exército: Edson Leal Pujol, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, Marco Antônio Freire Gomes (todos no governo Bolsonaro), Júlio Cesar Arruda (já no governo Lula) e, até o fim de 2023, de Tomás Ribeiro Paiva.
Como chefe de gabinete do general Freire Gomes no Forte Apache, Montenegro, segundo a imprensa, teve influência na nota “Às Instituições e ao Povo Brasileiro”, com a qual em novembro de 2022 os então comandantes do Exército, Marinha e Aeronáutica declararam apoio público ao “povo brasileiro” acampado na frente dos quartéis e ameaçaram publicamente com o “cumprimento das nobres missões de Soldados Brasileiros” as instituições que tentassem mandar os acampados de volta para casa.
No fim de 2023, Montenegro foi promovido a quatro estrelas e rendido na chefia de gabinete do general Tomás Paiva pelo general de divisão Marcio de Souza Nunes Ribeiro. Ribeiro vinha de ser chefe de gabinete do general Paulo Sergio Nogueira de Oliveira no Ministério da Defesa, de julho a dezembro de 2022. Neste período, o general Paulo Sergio atuou ostensivamente como ministro dos Ataques Militares às Urnas Eletrônicas.
Os ataques militares às urnas eletrônicas foram a base a partir da qual a trama golpista se desenrolou, culminando no 8/1.
Em agosto de 2022, por exemplo, foi ao general Marcio de Souza Nunes Ribeiro que o líder de um movimento golpista-ruralista endereçou um pedido para enfiar 27 tratores do “agro” no desfile do bicentenário da Independência. O Ministério da Defesa autorizou a presença dos tratores, turbinando a degeneração da solenidade cívica oficial do 7 de Setembro em ato de campanha de Jair Bolsonaro.
O general Paulo Sergio Nogueira de Oliveira foi exonerado da chefia do Ministério da Defesa ainda no dia 31 de dezembro de 2022, pelo presidente por um dia Hamilton Mourão, general Hamilton Mourão. O general Marcio de Souza Nunes Ribeiro foi exonerado da chefia de gabinete do ministro da Defesa no dia seguinte, 1º de janeiro de 2023, voltando a cargo importante - sim senhora. Sim, senhor - ainda naquele ano, pelas mãos de Tomás Paiva.
Naquele ano, em julho, com sete meses de governo Lula, o general Paulo Sergio fez sua última “viagem a serviço”, segundo o Portal da Transparência. Foi de Brasília para Belém do Pará. O motivo da viagem, conforme o Portal da Transparência, foi “acompanhar o comandante do Exército em viagem oficial ao Comando Militar do Norte nos dias 10 e 11 de julho de 2023”.
Naquele 11 de julho de 2023, enquanto o ex-ministro dos Ataques Militares às Urnas Eletrônicas acompanhava o general Tomás Paiva em viagem oficial, a convite do Forte Apache, Mauro Cid irrompia no plenário da CPMI do 8/1 usando sua farda de tenente-coronel. A orientação sobre com que roupa o ex-ajudante de golpe se apresentou à CPMI partiu do Comando do Exército.
No mês seguinte, agosto de 2023, Tomás Paiva nomeou como oficial do seu gabinete um outro tenente-coronel, André Luiz Cruz Correia, que tinha sido exonerado do GSI após a Polícia Federal descobrir, via celular de Cid, que Correia integrou um grupo de WhatsApp onde militares discutiam golpe de Estado em 2022.
André Luiz Cruz Correia serviu no gabinete do comandante do Exército até maio do ano passado, quando o general Tomás Paiva o nomeou para comandar os mais de 800 militares do 4º Batalhão de Polícia do Exército, no Recife.
Em outubro de 2023, a CMPI pediu os indiciamentos do tenente-coronel Mauro Cid e e do general Paulo Sergio por associação criminosa, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e Golpe de Estado. Em novembro do ano passado, o tenente-coronel e o general foram indiciados pelos mesmos crimes pela Polícia Federal, no âmbito do inquérito do golpe.
As férias do general Tomás Paiva terminam nesta quarta-feira, 15. Nesta quinta, 16, ele volta ao seu gabinete de curiosidades.