O golpe e o golpe do INSS
A mídia que pede o pescoço de Calos Lupi, por causa de omissão, é a mesma que trata o general Freire Gomes, que sabia da conspiração golpista e nada fez, como herói da Democracia.
O grosso da mídia brasileira vem cobrando insistentemente que o presidente Lula demita o ministro da Previdência, Carlos Lupi, após vir à tona o golpe das cobranças fraudulentas nas aposentadorias de dezenas de milhares de brasileiros. A cobrança - de demissão - faz sentido: Lupi sabia do golpe contra os aposentados desde 2023, mas não fez grande coisa para pôr um fim nele, deixando correr soltos por dois anos os descontos não autorizados em pagamentos do INSS.
A mídia que pede o pescoço de Lupi, por causa de omissão, é, porém, a mesma que não se cansa de tratar como herói da Democracia o general Marco Antônio Freire Gomes. Aquele que, na condição de comandante do Exército Brasileiro em 2022, sabia do golpe de Estado posto em marcha desde antes da eleição daquele ano e nada fez para pôr nele um fim, deixando-o correr solto por meses, a ponto de uma gangue de kids pretos sair a campo para sequestrar ou matar Lula, Alckmin e Alexandre de Moraes, já no adiantado da conspiração ininterrompida.
A ponto, não vamos nos esquecer, de as sedes dos Três Poderes serem completamente destruídas dias após o general sair mudo do comando do Exército, calado sobre o golpe que seguiu em andamento mesmo depois da posse de Lula, deitando por terra, deixando natimorto o álibi que viria a apresentar mais tarde, só quando foi chamado às falas pela Polícia Federal: “não abri a boca para não correr o risco de ser substituído por algum aventureiro”.
Um comentarista de tudo da GloboNews chegou a dizer nesta segunda-feira, 28, fiel ao seu estilo bazófio, que o governo deveria demitir “até quem servia cafezinho no INSS”. É o mesmo fanfarrão que costuma dizer que foram os generais do Alto Comando que impediram o golpe de Estado em 2022, em vez de tê-lo alimentado até o último momento.
“É diferente”, dirão alguns.
De fato, é bem diferente: ao contrário de Lupi, que aparentemente não participou do golpe contra os aposentados, Freire Gomes destacou oficiais do Exército para a untadura do golpe, ou seja, para a campanha de ataques às urnas eletrônicas; mobilizou o Centro de Comunicação Social do Exército para tumultuar o período eleitoral, quando o CCOMSEX chegou a pôr uma tarja de “fake news” em notícia de que o Alto Comando respeitaria o resultado da eleição; soltou nota oficial, 11 dias após a eleição, ameaçando com o “cumprimento das nobres missões de Soldados Brasileiros” as instituições da República que tentassem mandar para casa quem estava pedindo golpe de Estado na frente dos quartéis.
Horas após a divulgação da nota “Às instituições e ao povo brasileiro”, o tenente-coronel Mauro Cid enviou mensagem de áudio ao general Freire Gomes relatando que “o pessoal elogiou muito” a nota; que “eles estão sentindo o respaldo das Forças Armadas”; que, com a nota, “eles estão se sentindo seguros para dar um passo à frente”; que o passo à frente seria puxar o “movimento” para o “Congresso, STF, Praça dos Três Poderes”.
Vamos continuar fingindo que não vimos o notório ajudante de golpe Mauro Cid informando o então comandante do Exército, quase dois meses antes do 8/1, sobre o plano do “movimento” de fazer o caldo do golpismo derramar, como derramou tragicamente, na Praça dos Três Poderes?
Eis o herói.
E já ninguém lembra que Jair Bolsonaro militarizou o INSS, enfiando no INSS milhares de militares da reserva a título de zerar a fila de concessão de direitos, desculpe, “benefícios”, e evidentemente que zerou foi nada, a não ser o caixa de universidades federais, as verbas para o combate ao trabalho infantil, os investimentos em moradia popular, etc.
Já ninguém lembra que o Ministério da Previdência havia sido extinto pelo golpe de 2016 - quando Michel Temer, numa canetada, transformou a pasta em secretaria do ministério da Fazenda - e só retornou com a volta de Lula ao Palácio do Planalto. Já ninguém lembra do nome do primeiro secretário de Previdência do governo Bolsonaro, aquele que ocupava o cargo, subordinado a Paulo Guedes, quando da origem do esquema, do escândalo que ora estoura no colo de Carlos Lupi.
O secretário de Previdência quando o golpe do INSS começou, em 2019, início do governo Bolsonaro, era o ultrabolsonarista Rogério Marinho, hoje senador, uma das principais vozes no Congresso pela anistia aos golpistas de 2022/início de 2023 e líder da oposição no Senado ao governo que desbaratou o golpe contra os aposentados, via CGU.
Nesta terça-feira, 29, a Comissão de Fiscalização e Controle votará um requerimento de convocação de Carlos Lupi, a fim de Lupi “prestar informações sobre as fraudes bilionárias em descontos indevidos no Instituto Nacional do Seguro Social”. O autor do requerimento é o senador Rogério Marinho.
O Brasil é muito engraçado, com essa cabeça de vento.
Boa tarde
Que diga a verdade.