O vento que derruba, mas não arrasa
Nas lojas do Véio da Havan, há réplicas da Estátua da Liberdade no lado de fora e, dentro, réplicas para as crianças, de brinquedo, do caminhão da Havan usado em bloqueio golpista de estrada em 2022.
No dia 24 de maio de 2021, uma bela lufada derrubou a réplica da Estátua da Liberdade da loja do Véio da Havan na cidade de Capão da Canoa, no litoral norte do Rio Grande do Sul. A imensa estátua não caiu bonito, não. Ou foi uma beleza, dependendo, digamos, do sentimento do mundo: a estátua caiu de cara no estacionamento da Havan não sem antes, a caminho do chão, ser atravessada na altura do peito por um poste de luz.
Naquele dia, Luciano Hang foi às redes sociais reclamar de comentários de políticos de esquerda a respeito do desabamento: “incrível como a esquerda vibra com a queda da liberdade”. Um dos alvos de Hang foi o deputado Paulo Pimenta (PT-RS), que tinha postado: “ciclone comunista derruba o símbolo do império e do fascismo no Brasil! Estátua da Havan despencou agora em Capão da Canoa RS!!! Seria um aviso dos céus ao que ocorreu ontem no Rio de Janeiro?”.
O que ocorreu no dia anterior no Rio foi uma das maiores “motociatas” promovidas por Jair Bolsonaro ao longo da pandemia, provocando grande aglomeração de pessoas sem máscara no Aterro do Flamengo. Naquele 23 de maio de 2021, o Brasil registrou 894 mortes por covid-19, enquanto, no Aterro, Pazuello, Claudio Castro e Tarcísio de Freitas, entre outros até hoje impunes, ajudavam Bolsonaro a espalhar ainda mais o vírus SarS-Cov-2.
Meses mais tarde, Bolsonaro, Pazuello e Luciano Hang seriam indiciados na CPI da Pandemia. O Véio da Havan foi indiciado por incitação ao crime. Conforme o relatório final da CPI, “em suas redes, Hang fez centenas de postagens para difundir o tratamento precoce, resistir ao lockdown e atacar as vacinas”.
Cento e sessenta e três quilômetros separam Capão da Canoa do município de Guaíba, na região metropolitana de Porto Alegre, onde nesta segunda-feira, 15, durante outra tormenta, outra “estátua da liberdade” da Havan desabou do seu monstruoso pedestal.
A profecia do Cabo Daciolo
Distância bem mais curta, 46 quilômetros, separa Guaíba da cidade de Nova Santa Rita, onde no dia 31 de outubro 2022, dia seguinte ao segundo turno das eleições daquele ano, um caminhão da Havan atolou em um desnível da BR-386 quando tentava se juntar a um dos bloqueios bolsonaristas de estradas contra o resultado da eleição presidencial, contra a vitória de Lula sobre Bolsonaro.
Nas lojas Havan, há réplicas da Estátua da Liberdade no lado de fora e, no lado de dentro, réplicas dos caminhões da Havan, de brinquedo, à venda para as crianças — o caminhão “patriota”, idêntico ao do bloqueio golpista de Nova Santa Rita.
Foi pelo Patriota, não o caminhão, mas o partido político, que o pastor evangélico e cabo dos bombeiros Benevenuto Daciolo — o Cabo Daciolo. Lembra dele? — foi candidato a presidente da República em 2018. Naquele ano, Daciolo gravou um vídeo na frente de uma megaloja da Havan em Goiás, na frente da estátua, apontado para a estátua e profetizando:
“Começaram a botar isso aqui no nosso país! Vai cair uma por uma! Tá repreendido! Tirem da nação!”
Luciano Hang escapou de ser indiciado na CPMI do 8 de Janeiro e no inquérito do golpe. Os indiciados no relatório da CPI da Pandemia, Hang entre eles, jamais foram denunciados pela Procuradoria-Geral da República. Ele, Hang, ainda não caiu do pedestal. Ao contrário: foi inaugurada semanas atrás uma estátua do Véio da Havan no Museu de Cera de Gramado.





