'Para baixar os alimentos, desemprego vai ter que subir'
Grande "vilã" da inflação neste início de ano, com alta de 22,5%, a abobrinha, por outro lado, abunda nas colunas de economia dos jornalões.
E nós que pensávamos que o mandamento “os juros vão ter que subir” era o mais indecente dos custos propalados do regime de metas de inflação.
Em entrevista ao blog de Miriam Leitão, n’O Globo, o economista Samuel Pessoa afirmou que “se a taxa de desemprego cai muito, a inflação começa a sair do controle”. “É fato”, ele diz. Na entrevista, publicada na última sexta-feira, 24, Pessoa diz ainda que no Brasil, no curto prazo, “a taxa de desemprego vai ter que subir ou a inflação vai continuar acelerando”.
Samuel Pessoa milita no Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), think tank da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Outro economista do Ibre/FGV é José Márcio Camargo, que foi o formulador do programa de governo do candidato do MDB à presidência da República em 2018, Henrique Meirelles - um ex-presidente do Banco Central. No Blog do Ibre, no post mais lido da história do Blog do Ibre, Camargo explica melhor o que Pessoa quer dizer com “a taxa de desemprego vai ter que subir”:
“Esta ligação entre inflação e desemprego decorre do fato de que, quanto maior a taxa de desemprego, menos renda é gerada na economia, seja porque menos empregos são criados, seja porque os empregos criados pagam menores salários”.
E prossegue:
“O resultado é uma menor demanda por bens e serviços. Quanto menor a demanda, menor o poder das empresas de aumentar os preços e maior a competição entre as empresas pelos consumidores remanescentes, o que aumenta o incentivo para que elas reduzam seus preços para aumentar a demanda por seus produtos”.
“Consumidores remanescentes”.
E nós que pensávamos em combater a pobreza, reduzir a desigualdade; em pleno emprego, segurança alimentar.
E eles que falavam em “capitalismo com face humana”.
Neste sábado, 25, em sua coluna na Folha de S.Paulo, Samuel Pessoa voltou ao tema “a taxa de desemprego vai ter que subir”.
“Não será possível estabilizar a inflação sem que o crescimento econômico desacelere e que a taxa de desemprego se eleve em direção à taxa natural, que roda em torno de 7,5%”, diz Pessoa na Folha.
Caso contrário, prossegue o economista do Ibre/FGV, “o presidente Lula colherá mais desvalorização do câmbio e encarecimento dos alimentos”.
A taxa de desemprego hoje no Brasil é de 6,1%. Pessoa quer vê-la em 7,5% - 1,4 ponto percentual mais alta. A pessoa quer ver 1,5 milhão de brasileiros a mais padecendo no flagelo do desemprego para ver se baixam os preços do café, do tomate e da abobrinha, que abunda nas colunas de economia dos jornalões, mas é a grande “vilã” da inflação neste início de ano, com alta de 22,5%.
No mesmo artigo, Samuel Pessoa diz que “talvez o momento mais desconfortável para um analista econômico seja reconhecer que uma taxa de desemprego muito baixa é um sinal de desequilíbrio e de excesso de demanda sobre a oferta de uma economia”.
Talvez. Porque, de fato, deve ser desagradável tentar explicar a loucura da razão econômica de que a comida está cara demais porque teria gente demais trabalhando e ganhando salário para comprá-la.
Ou talvez o momento de maior deslustre do analista econômico tenha sido no dia do segundo turno das eleições de 2018, quando, na mesma Folha, ele considerou que havia “histeria no ar com a possibilidade de um golpe clássico ou com a deterioração da democracia com Bolsonaro”; quando defendeu um “conteúdo positivo, propositivo, no voto para o tenente que se aposentou como capitão”.
Entre o “conteúdo positivo, propositivo” estava, segundo Samuel Pessoa, o “reforço do direito de propriedade com a criminalização das invasões - seja de imóveis urbanos ou propriedade rural -, empregadas como mecanismo de pressão contra nossas desigualdades históricas”.
Contra os altos preços dos alimentos, reforma agrária e combate às mudanças climáticas, por exemplo, nem pensar. Não para quem milita no Ibre/FGV e outros think tanks do neoliberalismo que, apontando saídas como “para baixar os alimentos, desemprego vai ter que subir”, abrem caminho mesmo é para o fascismo.
Aliás, quanto à taxa básica de juros e regime de metas de inflação, os analistas econômicos têm sido unânimes em parafrasear Goebbels, a exemplo de um certo secretário de Cultura do tenente que se aposentou como capitão: nas duas próximas reuniões do Copom, dizem, a alta da Selic será de um ponto percentual, ou não será nada.
Tenho uma ideia.
Vou plantar dois ou três pés de abóbora.
Não abobrinha, mas aquela "curraleira" que fica bem vermelha e serve pra cozinhar com curimatã quando temos dengue.
A semente também e muito boa pro café da manhã.
Imagino que se uns 39 milhões de brazucas fizerem, não vai ter necessidade de desemprego nem compra-la no supermercado...