Páreo duro no Nobel da Paz
Em 1940, 85 anos antes de Trump propor ao Irã — ao mundo — “paz ou tragédia” em discurso na Casa Branca, Hitler ofereceu à Grã-Bretanha — ao mundo — “paz ou destruição” num discurso no Reichstag.
“Sábado à noite tudo pode mudar”, já dizia o poeta Luiz Maurício Pragana “Lulu” dos Santos.
Na noite deste sábado, 21, horas após os EUA atacarem o Irã com o que há de mais devastador neste mundo em armamento não nuclear, logo após os EUA possivelmente mudarem o curso da história desse mundo - se é que restará algum -, Donald Trump tirou o boné Make America Great Again que usou para acompanhar o bombardeio numa “sala de crise” e apareceu ao lado de J.D. Vance, Marco Rubio e Pete Hegseth para exigir a paz.
“Ou haverá paz, ou haverá tragédia para o Irã”, afirmou Trump, como quem apela à razão.
Após Trump, apareceu o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, dizendo que “primeiro vem a força, depois vem a paz”.

“Quero agradecer e parabenizar o primeiro-ministro Bibi Netanyahu. Trabalhamos em equipe como talvez nenhuma outra equipe tenha trabalhado antes”, dissera ainda, pouco antes, o presidente dos EUA, ao lado do seu vice e secretários de Estado e de Defesa.
Mas outras equipes já trabalharam de forma parecida.
Em 19 de julho de 1940, 85 anos antes de Donald Trump propor ao Irã “paz ou tragédia” em discurso na Casa Branca, Adolf Hitler ofereceu à Grã-Bretanha — ao mundo — “paz ou destruição” num famoso discurso de “apelo à razão geral” — palavras do führer — no Reichstag.
Presente naquele dia no Reichstag, o conde Galeazzo Ciano, genro de Benito Mussolini e ministro das Relações Exteriores da Itália fascista, ouviu atentamente Hitler agradecer e parabenizar o Duce pelo apoio na “guerra imposta ao Reich alemão” pela “camarilha belicista”.
Naquele dia, naquele discurso, Hitler reclamou que o Acordo de Munique, de 1938, no qual Grã-Bretanha e França concordaram com a anexação dos Sudetos tchecos pela Alemanha, para tentar “apaziguar” o führer e evitar a guerra, “não foi bem recebido pela opinião pública em Londres e Paris”:
“Os belicistas capitalistas judeus, com as mãos cobertas de sangue, viam no possível sucesso de tal revisão pacífica o desaparecimento de bases plausíveis para a concretização de seus planos insanos”.
Em 1939, o deputado antifascista sueco Erik Brandt indicou Hitler para o prêmio Nobel da Paz pelo Acordo de Munique:
“Graças ao seu ardente amor pela paz, anteriormente documentado em seu famoso livro Mein Kampf — talvez a melhor e mais popular obra literária do mundo, depois da Bíblia —, e à sua conquista pacífica, libertando seus compatriotas nos Sudetos e tornando sua pátria grande e poderosa. Provavelmente, Hitler, se não for molestado e deixado em paz pelos belicistas, pacificará a Europa e possivelmente o mundo inteiro”.
A indicação de Adolf Hitler para o Nobel da Paz pelo Acordo de Munique foi, como se vê, um protesto, uma ironia.
Neste sábado, 21, horas antes de os EUA atacarem o Irã por suposta violação do acordo de não proliferação de armas nucleares, o governo do Paquistão anunciou que indicará Donald Trump para o Nobel da Paz, por Trump “impedir uma grande escalada da violência” na Caxemira.
Desta vez, não há ironia, não. É só tragédia mesmo.