'Precisamos começar a chamar isto pelo que isto realmente é'
Juntando-se a Trump no rufar dos tambores de uma "guerra interna" nos EUA, governador republicano do Texas dirigiu-se ao governador democrata do Illinois nos seguintes termos: "saia do caminho".
No últimos dias, Donald Trump tentou burlar uma decisão da Justiça que proibiu a Casa Branca de mobilizar a Guarda Nacional do Oregon para reprimir manifestações em Portland, capital do estado, contra a perseguição a imigrantes promovida pelo governo MAGA dos EUA. Após a decisão judicial, Trump determinou o envio para a “cidade das rosas” de tropas de outros estados federalizadas e não exatamente com flores nas mãos.
No último 25 de setembro, o presidente dos EUA mencionou especificamente “facções de Portland” durante uma espécie de cerimônia no Salão Oval para assinatura de um memorando de combate ao “terrorismo doméstico” e à “violência política organizada”. Foi em Portland que em 2020, final do primeiro governo Trump, aconteceram mais de 100 dias de protestos Black Lives Matter após o assassinato de George Floyd por policiais.
Em audiência emergencial realizada neste domingo, 5, a juíza Karin Immergut alertou advogados do governo dos EUA que Trump está agindo “em violação direta” da Justiça e ampliou sua decisão anterior de modo a abranger expressamente “a realocação, federalização ou implantação de membros da Guarda Nacional de qualquer estado ou do Distrito de Columbia no estado do Oregon”.
Primeiro, Donald Trump determinou o envio de 300 soldados da Guarda Nacional da Califórnia para Portland, sob protestos dos governadores Gavin Newsom, da Califórnia, e Tina Kotek, do Oregon, ambos democratas. Depois, Trump ordenou a realocação de 400 soldados da Guarda Nacional do Texas para Portland e Chicago, no Illinois, a título de proteger as instalações e os agentes do Serviço de Imigração e Alfândega dos EUA (ICE, na sigla em inglês).
O governador republicano do Texas, Greg Abbott, juntando-se a Trump no rufar dos tambores de uma guerra civil nos EUA, dirigiu-se ao governador democrata do Illinois, JB Pritzker, nos seguintes termos:
“Você pode aplicar totalmente a proteção aos funcionários federais ou sair do caminho e deixar que a Guarda do Texas faça isso. Nenhuma guarda pode igualar o treinamento, a habilidade e a experiência da Guarda Nacional do Texas. Eles defendem nosso país com orgulho.”
Pritzker, por seu turno, alertou que “precisamos começar a chamar isto pelo que isto realmente é: uma invasão de Trump”, e conclamou os estadunidenses a se manifestarem para “ajudar a acabar com essa loucura”.
A invasões de Trump a cidades governadas por democratas acontecem no momento em que o Departamento “de Guerra” dos EUA trabalha em uma nova estratégia de defesa nacional com foco em “segurança interna”. Na semana passada, Trump e seu secretário de “de Guerra”, Pete Hegseth, reuniram centenas de oficiais generais estadunidenses na Virgínia para dizer que os EUA estão sob ameaça de “inimigos internos que não usam uniformes”; para falar a generais sobre “guerra interna” nos EUA.
Pode ser que já ninguém aguente mais os paralelos entre a escalada MAGA nos EUA e a transformação dos EUA em Gilead no livro O conto da aia, de Margaret Atwood, e na série de streaming. Mas as invasões de Donald Trump a Portland e Chicago e as movimentações de Trump contra “inimigos internos que não usam uniformes” lembram mesmo, e muito, o início da série; lembram o ambiente que precede a cena na qual soldados de uma guarda estranha às forças de segurança legais de Massachusetts de repente abrem fogo contra manifestantes em Boston.
Mas não foi tão de repente assim: a cena marca o momento no qual as coisas que não eram chamadas pelos nomes corretos, a não ser aqui e ali, acabam se anunciando elas próprias, sem álibis, aos berros de metralhadoras — “ratatatá, ratatatá”.