'Repúdio à impunidade', general?
Atual comandante do Exército, o general Tomás foi quem sugeriu o termo-chave da ameaça da Força ao STF, contra Lula, em 2018 — "repúdio à impunidade". Agora, tenta aliviar a punição ao general Heleno.
A Folha de S.Paulo informa que a prisão em regime domiciliar para o general Augusto Heleno é uma demanda do Comando do Exército apresentada ao relator da Ação Penal do Golpe, ministro Alexandre de Moraes, antes mesmo de Heleno ter sido condenado a 21 anos de prisão pelo Supremo Tribunal Federal.
“Com a confirmação da condenação, em setembro, os pedidos, levados a Moraes pelo comandante do Exército, general Tomás Paiva, foram reforçados. Os dois mantêm uma boa relação e se encontraram diversas vezes durante o julgamento”, informa o repórter Fabio Victor, que assina a matéria da Folha.
“Nas conversas entre Moraes e Tomás — informa ainda Fabio Victor —, não foi mencionada a doença de Alzheimer”. A demanda de Tomás Paiva não foi, a princípio, atendida por Moraes: no dia 25 de novembro, Heleno começou a cumprir pena em uma sala especial no Comando Militar do Planalto. Mal chegou ao “cárcere”, porém, Heleno teria dito ao Exército, durante um Exame de Higidez Física, ser portador de Alzheimer.
É o que afirma a Força que, armada, requisita ao Judiciário que o golpista “muito querido no Exército” seja levado para o conforto de seu lar.
Fabio Victor é possivelmente o mais sério e competente jornalista “especializado” nas Forças Armadas do Brasil. Ele é autor do livro Poder Camuflado — os militares e a política, do fim da ditadura à aliança com Bolsonaro, lançado em 2022 e ganhador do Prêmio Jabuti.
Na página 171 de Poder Camuflado, ele conta detalhes de um episódio-chave da história recente do Brasil: a ameaça pública feita ao STF em 2018 pelo então comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, na véspera do julgamento pelo Supremo do Habeas Corpus que poderia ter colocado Lula na disputa presidencial contra Bolsonaro nas eleições daquele ano:
“O texto que resultaria num tuíte de Villas Bôas coagindo o Supremo começou a ser esboçado dias antes pelo comandante, com o auxílio sobretudo do general da reserva Alberto Cardoso, seu ‘ícone de liderança’. A versão original deixava claro que o Exército seria contrário a uma eventual concessão de habeas corpus a Lula — e não subentendido, como por fim foi publicado. Em conversas entre si e com Villas Bôas, o generais Cardoso e Joaquim Silva e Luna (então ministro da Defesa) ajudaram a moderar o teor da mensagem. Sua edição final, naquele terça-feira fatídica, mobilizou o gabinete pessoal do comandante do Exército, formado pelos generais Tomás (chefe de gabinete), Rêgo Barros (Comunicação) e Ubiratan Poty (Inteligência) — todos da turma de 1981 da Aman. Numa reunião iniciada às seis da tarde, da qual participou também o chefe do Estado-Maior, Fernando Azevedo e Silva, foi batido o martelo sobre a publicação e o teor da mensagem. Tomás deixou o Forte Apache e se preparava para um jantar na casa do almirante Flávio Rocha, então chefe de gabinete do comandante da Marinha, Leal Ferreira. Às 19h50, recebeu uma ligação de Villas Bôas, que leu para ele a versão final depois de mais alguns pequenos ajustes. Tomás elogiou o resultado e em seguida ligou para Rêgo Barros [então chefe do Centro de Comunicação Social do Exército e o auxiliar direto que tinha a senha do perfil oficial de Villas Bôas no Twitter], autorizando a publicação”.
O Habeas Corpus a Lula foi negado e o pupilo de Villas Bôas — “sua maior aposta para o futuro”, nas palavras de Fabio Victor em Poder Camuflado — não apenas autorizou a publicação da intimidação do Exército a um dos poderes da República, contra Lula. Foi dele, do general Tomás, agora chefe da Força Terrestre, a sugestão do termo-chave daquele tuíte: “repúdio à impunidade”.
Ora viva: o general do “repúdio à impunidade” dedica-se agora a aliviar a barra de general golpista, a suavizar a pena de condenado por golpe de Estado.





