
Parecia até aquela humilhação de acelerar o carro quando alguém se aproxima para abrir a porta e entrar, repetindo-se o enxovalho alguns metros à frente e de novo, de novo, de novo, até que o motorista - quem conduz, quem pilota - finalmente deixa o humilhado sentar.
Já passava das 22:00h desta quarta-feira, 6, quando Hugo Motta (Republicanos-PB) aproximou-se da cadeira da presidência da Câmara, após abrir caminho com dificuldade entre os deputados golpistas, mas, como a cadeira continuasse ocupada por um deles, era voltar para os bastidores com o rabo entre as pernas ou ficar esperando com cara de mamão.
Voltou.
Quando já estava a alguns metros da saída para a sala da presidência, Motta foi chamado pelo motorista a tentar outra vez. E lá foi Huguinho abrindo caminho de novo num corredor polonês de Zezinho, Dr. Luizinho, etc, sorrindo amarelo, até finalmente conseguir sentar-se.
Antes disso tudo, Zezinho, o deputado Zé Trovão (PL-SC), posicionou-se no meio da pequena escada que dá acesso à Mesa da Câmara. Vestindo chapéu de caubói e usando um broche de fuzil, encostou-se na parede e esticou a perna de modo a impedir a passagem de não autorizados: “aqui ninguém passa. Eu derrubo boi de 400 quilos”. Transmitindo ao vivo no Instagram, o leão de chácara de golpe apontou os líderes dos invasores e trovejou:
“Hugo Motta só passa se o pessoal ali deixar!”
Nesse momento, a deputada Julia Zanatta (PL-SC), a “feminista de fuzil”, estava sentada na cadeira da presidência da Câmara amamentando sua filha bebê. Correndo o zunzum de que os golpistas seriam retirados à força, Zanatta usou como escudo humano sua filha de quatro meses de vida. Transmitindo ao vivo no Instagram, a invasora debochou:
“A cadeira da presidência agora é cadeira de amamentação.”
Antes de Julia Zanatta, no rodízio entre os golpistas para não deixar vazia a cadeira de Hugo Motta, quem estava sentado nela era o deputado Marcos Pollon (PL-MS), o fundador do Movimento Pró-Armas, maior organização armamentista do Brasil, que costuma repetir sem parar, mais macho que Zé Trovão, que “minha mãe pariu um homem!”. Nesta quarta, porém, também transmitindo o golpe ao vivo pelo Instagram, Pollon repetia outra coisa sem parar:
“Ave Maria, cheia de graça, o Senhor é convosco, bendita sois vós entre as mulheres e bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus”.
Marcos Pollon foi o último invasor a se retirar da Mesa da Câmara, após acordo ainda secreto entre Hugo Motta e os golpistas. Logo depois, um repórter da Globo News deu numa palavra a notícia do dia:
“Sentou!”
Sentou, mas não tragou.
Finalmente acomodado no couro de crocodilos jazzistas do Baixo Mississippi, Hugo Motta determinou que os invasores saíssem de trás da Mesa e descessem para o plenário. Ninguém se moveu. Depois, o “presidente” amoleceu: “estou pedindo educadamente”. Nada. Pediu “educadamente” outra vez, sem sucesso.
Foi quando Motta começou a gaguejar, a balbuciar coisas desconexas, a não completar frases. Não sabia o que fazer. Por fim, entubou, abriu a sessão assim mesmo e começou a fazer seu breve discurso. Literalmente emparedado pelos golpistas atrás de si, com Nikolas Ferreira (PL-MG) e o Tenente-Coronel Zucco (PL-RS) dando encontrões na “cadeira de amamentação”, na cadeira de mil bundas, foi com o bumbum apertadinho que Hugo Mamatta saiu-se com essa:
“Eu entendo as razões de todos que motivaram os movimentos aqui realizados”.
São essas as notícias de um sequestro.
Fulguras, ó Brasil!
Ótimo relato! E ainda nikolas ferreira, parecendo querer ser um papagaio de pirata, mas na verdade posando como um inominável grilo falante agarrado nas costas da cadeira que deveria estar sendo ocupada por um presidente.
Ou Regimento Interno neles...