Bombas em Brasília: a solidão fake do 'lobo solitário'
É como já dizia a Epístola do Terrorista George Washington a Jair Bolsonaro: “o senhor despertou esse espírito em nós. O senhor sabe muito bem disso”.
Seria anedótica, não fosse a tradução da tragédia política brasileira, a pouca sutileza das Forças Armadas para pressionar os Poderes Civis em praça pública, mobilizando em revezamento meia dúzia de recadeiros da imprensa para dizer que os militares estão “incomodados” com isto, “tensos” com aquilo, “acompanhando com atenção” aquilo outro, até “irritados”.
Nesta semana, porém, pintou algo de novo nesse front.
No site do Estadão, uma matéria publicada às 18h50 da última terça-feira, 12, informou no título que “cúpula militar se revolta com maneira com que se dá inclusão da Defesa nos cortes do governo Lula”, e informou no texto que, “para efeito de comparação, eles [os militares] apontam outras carreiras de Estado. Quase sempre o Poder Judiciário que, na opinião dos militares, têm super salários”.
“Revolta” é “otro patamá”.
A matéria é assinada pela mesma jornalista que em fevereiro publicou que uma operação da Polícia Federal contra generais “constrange as Forças Armadas”; que em abril, a respeito de investigações sobre os desaparecidos da ditadura, preveniu que setores do Exército “entendem que a busca não pode ser um fim em si mesma”; que em agosto fez saber que um corte no orçamento do Exército “preocupa militares”.
O problema de cúpula militar fazendo circular zum-zum de que está em “revolta”, e voltando baterias contra o Judiciário, é que no dia seguinte, literalmente no dia seguinte, pode acontecer um atentado contra o órgão de cúpula do Judiciário cometido por um arquétipo do terrorista que a cúpula militar acalentou, legitimou, nos acampamentos golpistas de pouquíssimo tempo atrás.
O terrorista desta quarta-feira, 13, Francisco Wanderley Luiz, explodiu seu carro no estacionamento de um anexo da Câmara dos Deputados e depois, vestido de Coringa, atravessou tranquilamente a Praça dos Três Poderes para explodir duas bombas na frente do STF.
Um “lobo solitário”, diz a imprensa.
“Ato isolado, solitário, de uma pessoa que não tinha ligação com ninguém”, chegou-se a dizer do terrorista George Washington de Oliveira, que tentou explodir uma bomba no aeroporto de Brasília na véspera de Natal de 2022.
“Ato isolado, solitário”, por mais que George Washington se reunisse com golpistas na porta do QG do Exército; por mais que saísse para plantar bombas na capital do país a bordo do carro de um blogueiro bolsonarista; por mais que o carro tenha sido encontrado depois, no Paraná, com um militar da Marinha ao volante, precisamente um primeiro-sargento do Batalhão de Operações Especiais de Fuzileiros Navais.
Por mais que George Washington tivesse escrito uma carta para Jair Bolsonaro lembrando que “em quase todos os seus pronunciamentos o senhor falou que o povo armado jamais será escravizado. Só saio daqui com a minha família em pé com a vitória”; lembrando que “o senhor despertou esse espírito em nós. O senhor sabe muito bem disso”.
Também sabe disso muito bem quem aceita publicar artigo de Bolsonaro pregando que “aceitem” a extrema-direita, e pregando feito o Coringa: “se suprimirem um líder, outro aparecerá”. Sabe disso também quem se arrisca em negociações palacianas de anistia a extremistas. Sabe disso o jornalista da Globo News que dias atrás se dirigia nestes termos, ao vivo, na TV, ao presidente do partido do bombista de agora e dos golpistas de 2022: “presidente Valdemar Costa Neto, prazer falar contigo sempre”.
(Valdo Cruz e Andreia Sadi receberam Valdemar Costa Neto no estúdio para falar sobre a PEC da Anistia).
Sabe disso melhor que ninguém o procurador-geral da República, Paulo Gonet, que tinha deixado para denunciar Bolsonaro só depois das eleições municipais, para “evitar impacto político”, e até agora nada. E colhendo, agora, o impacto de bombas em Brasília. Meses atrás, Conrado Hübner Mendes ironizou Gonet: “se bobear, vai também esperar a eleição americana”. Bobeou, e a eleição americana já passou também.
E assim se dá o despertar espiritual, como diria George Washington, dos “solitários” como ele próprio e como o que nesta quarta tocou o terror no coração das “Forças Desarmadas”, à noite, horas depois das reuniões de Haddad com a cúpula militar revoltada, pela manhã, e da cúpula militar revoltada com Lula, à tarde, para defender as pensões das filhas do coronel Brilhante Ustra, enquanto a UFRJ estava às escuras, sem dinheiro para pagar a Light.
E, não menos importante, horas antes do início da Operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) no Rio de Janeiro, para a cúpula do G20. E vamos recorrer a um trechinho da peça “Dr. Getúlio, sua vida e sua glória”, de Dias Gomes e Ferreira Gullar:
E enquanto essas coincidências
iam assim coincidindo,
num clube então existente,
um homem muito ladino
fazia uma conferência
sobre um tema pertinente,
com este titulo: “Como
se depõe um Presidente”
Hoje pela manhã, comentário do meu pai, sempre exposto a quilos de bolsonarismo: "agora vão dizer que é culpa do Bolsonaro". Parece que as máquinas de fakes estão azeitadas em dizer o oposto do que vc diz, reforçando a importância da sua reflexão.
Um lobo solitário, decidido a explodir o STF, acabou por explodir a si mesmo. Os neofascistas começarem rapidamente a difundir a tese de que foi o ato isolado de um sujeito desequilibrado mentalmente, nada que se possa generalizar. Estão preocupados com o que pode ser um golpe definitivo no projeto de anistiar os golpistas. Nessa hora é preciso relembrar o histórico da sanha terrorista que sempre caracterizou o fascismo no Brasil.
O discurso do ódio, base do Ur-fascismo, sempre alimenta dissonâncias cognitivas, insanidades e distúrbios diversos nas mentes de seus seguidores. Pode atingir tanto uma manada de zé-ninguéns ressentidos, como no 8 de janeiro de 2023, quanto pessoas com poderes reais de causar sérios estragos.
Um 1971 um brigadeiro alucinado planejou explodir a adutora do Guandu e o antigo Gasômetro do Rio de Janeiro, que poderia ter causado mais de cem mil mortos. Graças ao Capitão Sérgio Macaco, que teve a sua carreira arruinada, o plano não foi em frente. Em 1981, militares do Exército de Caxias, tentaram explodir uma bomba num show no Riocentro, que mataria milhares de jovens e vários artistas da MPB. Por obra do destino, a bomba explodiu no colo de um deles e a tragédia não se consumou. Tivemos bombas em bancas de jornais e na OAB-RJ. Depois, um certo tenente do Exécito, em busca de aumentos salariais, também planejou explodir bombas. Mais recentemente, logo após as ultimas eleições presidenciais, por sorte não tivemos a explosão de uma bomba no aeroporto de Brasília, que causaria um número inimaginável de vítimas. E recentemente soubemos que “kids pretos”, também do valoroso Exército de Caxias , além de terem cometidos “atos isolados de indisciplina” derrubando torres de transmissão, planejavam sequestrar o Ministro presidente do STF e o Presidente da República, sabe-se lá pra fazer o que com eles.
A impunidade é a mãe de todos esses crimes continuados. Existem inúmeros “Tiu França” à solta por aí, muitos armados pelos CACs e outros vestindo uniformes militares. Por essas e por outras, só há uma coisa a dizer, aos berros: SEM ANISTIA!