2 Comentários
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Avatar de Lívia Duarte

Ao ler aqui me dei conta de que a cena do dente, que te toca, é mais um enterro no filme (com posterior desenterro, que só a mãe será capaz de revelar). Quantas coisas a gente guarda em uma casa, quantas histórias em cada coisinha que fica esquecida nas gavetas e o quanto elas nos servem em horas futuras... A cena que me dilacerou no filme é a de outro enterro, a do cachorro. Eu só conseguia (chorar e) pensar: "que caralho de país em que - eu sabia, eles não - é possível respeitar honras fúnebres ao cachorro, mas será vedado enterrar o próprio pai?!". E tinha me esquecido, mas também lembrei agora, da alegria que senti pelo lugar onde assisti: fomos a uma sessão no Cine Brasília, não sei se logo no fim de semana da estreia ou no segundo. A fila serpenteava imensa, o hall dos fundos totalmente cheio, eu um pouco tensa com a hipótese de perder meu marido naquela pequena multidão - nos perdemos em outra bem maior dias antes e foi um enrosco pra reencontrar. Entive tão feliz com o alarido das pessoas, a pipoca, a curiosidade, o entreouvir das conversas. O domingo no cinema. Gente de todas as idades, muitos jovens. Quando saímos era puro silêncio, eu não quis falar nada - coisa bem rara - mas fiquei presa na importância de enterrar, despedir-se pra se ter certeza de que o outro, que tantas vezes dizemos que perdemos, na verdade não se perdeu. Parei sob as árvores velhas só por um minutinho e rumei meio desconcertada ao prédio vizinho, onde minha filha me esperava. Um abraço, Sylvia!

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Avatar de Sylvia Debossan Moretzsohn

Sim! Um enterro, um desenterro... eu pensei também na simbologia do atropelamento e do enterro do cachorro, em paralelo ao corpo do pai que jamais será enterrado, pelo menos não pela família. Mas achei que o cachorro esteve no roteiro apenas para essa cena. Quando aparece pela primeira vez, aliás, achei estranho que o menino o tivesse simplesmente levado pra casa: minha reação seria imaginar que ele estava apenas circulando pela praia e haveria de pertencer a alguém. Nem sei se essa cena está no livro, que li há muito tempo, logo que saiu, mas muitas não estão, a adaptação para o cinema é outra coisa.

Mas suas observações e seu relato sobre o dia em que foi assistir ao filme são excelentes. Esse contraste entre a excitação na fila da entrada e o silêncio na saída: é impressionante.

Por que você não escreve sobre isso? E sobre a cena do cachorro?

Muito obrigada pelo comentário.

Beijo, saudades de ti!

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