'Eu converso com o fogo, eu converso com a floresta'
"Eu discurso lindamente a favor da Democracia, mas digo coisas estranhas em palestra para agrogolpistas".
Come Ananás chamou a atenção nesta sexta-feira, 22, para o “foro” inquietante onde o presidente do STF, Luis Roberto Barroso, afirmou dias atrás que, após o julgamento da ação penal do golpe, a anistia “passa a ser uma questão política” a cargo do Congresso Nacional, como se não houvesse séria dúvida - dúvida constitucional - sobre se é possível anistiar quem tentou aniquilar o Estado de Direito.
Barroso disse o que disse em uma palestra sobre “Poder Judiciário, Segurança Jurídica e o Agronegócio” dada por ele na última segunda-feira, 18, na Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso. A Aprosoja-MT é o sindicato patronal que até outro dia patrocinava a realização no Brasil, sob a batuta de Eduardo Bolsonaro, de eventos da Conferência de Ação Política Conservadora, a CPAC, entidade extremista de agitação do MAGA-trumpismo.
O presidente da Aprosoja-MT é o sojicultor do “Nortão” mato-grossense Lucas Costa Beber. Lucas Beber foi indiciado pela CPMI do 8/1 por associação criminosa, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado. Ele é filho de Sinar Costa Beber, dono de caminhões usados em bloqueios de rodovias no estado após a eleição de Lula em 2022.
Após a palestra, Luis Roberto Barroso falou à TV Justiça tendo ao fundo um painel com a imagem da velha senhora Justitia carregando a balança do equilíbrio. “Confundindo” equilíbrio com coisa diferente, com olhos bem vendados para as profundas contradições da sociedade de classes, Barroso arrazoou que deve-se dar aos pretextos do fogo o mesmo peso das razões da floresta.
“Eu converso com sindicatos patronais, eu converso com sindicatos de empregados. Eu converso com comunidades indígenas, eu converso com o agronegócio. Eu converso com dirigentes do iFood, eu converso com entregadores do iFood”, disse o antigo “constitucionalista progressista”.
Come Ananás registrou todas as três ocasiões: em maio, Barroso participou de um jantar “beneficente” na casa do presidente do iFood, Diego Barreto, em São Paulo, quando os dois divertiram os convivas cantando, juntos, Garota de Ipanema; em junho, Barroso voltou a encontrar Barreto, desta vez no Fórum Esfera 2025, no Guarujá, litoral paulista; em julho, Barroso e Barreto participaram de outra surubada juscorporativa, a mais famosa de todas: o “Gilmarpalooza”, em Lisboa. Agosto ainda não terminou…
A última vez que Luis Roberto Barroso encontrou entregadores do iFood foi há pouco mais de uma semana, no último dia 15, em um evento na USP. Enquanto Barroso acomodava-se egregiamente, insigne, excelentíssimo numa cadeira do Salão Nobre da faculdade de Direito para falar sobre “inteligência artificial”, o jovem Renato Assad, autor do livro Entregadores de aplicativos: a luta de um novo proletariado, gritava lá fora ao lado de vários motoboys:
“Barroso, não é empreendedorismo! Não tem autonomia! Motoboy morre todo dia na rua e você comemorando com o iFood.”
Naquele dia, ecoou pelo Salão Nobre da Faculdade de Direito da USP o coro do precariado vindo lá de fora:
“Barroso, que papelão! Canta samba com o iFood e apoia a exploração!”